Qual é o padrão alimentar saudável?

«A situação nutricional decorrente de alimentação insuficiente, excessiva ou desequilibrada é hoje o principal problema de saúde no mundo.»

Então como deve ser a alimentação para que dela resulte bem-estar?

Como se caracterizará o «padrão alimentar saudável»?

A resposta merece grande interesse aos investigadores e resulta do confronto de 4 tipos de investigação: análise de modelos alimentares adoptados por grupos humanos com elevados níveis de saúde; estudo seriado de casos; estudo de modificações funcionais e orgânicas induzidas por intervenções dietéticas e formulação de opostos aos erros alimentares mais nefastos; estudos laboratoriais de natureza bioquímica, fisiológica e anatómica.

Historicamente, a formulação de um padrão alimentar sadio percorreu dois períodos sucessivos. Num primeiro período, avançaram-se propostas para contrariar doenças, em especial as cardiovasculares, numa perspectiva preventiva — foi o tempo da «dieta prudente». Num segundo período, actual, a formulação tem em vista conhecer o padrão mais consentâneo com pleno desenvolvimento, completo bem-estar e máxima esperança de vida.
O conceito tem evoluído e afina-se. Uma coisa é certa: a alimentação saudável não depende apenas de conhecer e satisfazer as necessidades nutricionais do organismo; depende também, aliás, preponderantemente, da boa utilização e do equilíbrio entre os alimentos que satisfazem aquelas necessidades. O momento actual é o da procura da prática alimentar que proporciona a situação nutricional e emocional mais propícia ao bem-estar, e não o da procura teórica e simplista de um padrão nutricional fisiologicamente adequado.
Por isso, não existe apenas um padrão alimentar saudável; são possíveis vários, como aliás já se inferia de estudos em povos com hábitos tão diferentes como japoneses rurais ou europeus mediterrânicos.
No estado actual dos nossos conhecimentos, um padrão alimentar saudável adaptado às exigências e gostos dos povos europeus, pelo menos do Sul da Europa, exige as condições a seguir descritas que recolhem o consenso dos especialistas e o aval da OMS.

1. Ajuste perfeito do valor energético da alimentação às características biológicas de cada um, diferentes necessidades das fases sucessivas do ciclo da vida, estatura, actividade física e clima. A finalidade é:

(1) Manter o peso do corpo nos limites desejáveis para todas as idades; no fundamental, e no nosso caso, não engordar;
(2) Gerar recém-nascidos bem desenvolvidos com peso entre 3,4 kg e 3,6 kg;
(3) Promover durante a infância e a adolescência o desenvolvimento máximo consentido pela herança genética;
(4) Estimular a aptidão imunitária para que seja grande a resistência do organismo tanto a agressões infecciosas como à doença em geral;
(5) Minimizar a morbilidade e a mortalidade induzidas por excessos ou défices calóricos.

2. Distribuição repartida da comida necessária por várias refeições a intervalos de 3 a 4 horas, com o cuidado de um primeiro almoço suficiente, completo e equilibrado, e atendendo a que o jejum nocturno não deve ultrapassar 10 horas. A finalidade é:
(1) Impedir o desenvolvimento de obesidade e de doenças correlacionadas;
(2) Ritmar a actividade do aparelho digestivo, do pâncreas endócrino e de outros reguladores metabólicos;
(3) Evitar sobrecargas digestivas por refeições copiosas;
(4) Impedir períodos de hipoglicemia e de destruição proteica;
(5) Melhorar a atenção e aumentar a segurança e o rendimento das actividades física e intelectual.

3. Equilíbrio perfeito entre fontes alimentares de energia de acordo com o referido padrão nutricional adequado.
Importa salientar que as calorias devem ser fornecidas na sua maior parte por alimentos hidrocarbonados e, de entre estes, por fornecedores de amido; que as gorduras alimentares devem ser usadas com parcimônia e que a mais saudável é o azeite; que as bebidas alcoólicas devem contribuir modestamente para a ração calórica e de acordo com as condicionantes já expostas; que o aprovisionamento de proteínas animais fica garantido com porções modestas de carnes e peixes; que o açúcar é dispensável.
Quando a ração calórica é satisfeita com alimentos naturais e, portanto, com grande densidade nutricional, ficam seguramente cobertas as necessidades de minerais, vitaminas, antioxidantes e complantix. A finalidade é:

(1) Limitar a expressão de doenças metabólicas genéticas (dislipidemias, diabetes, hiperuricemia, etc.) e impedir o aparecimento desses distúrbios em indivíduos não predispostos, em consequência de grande sobrecarga ou desequilíbrio das fontes de energia;
(2) Limitar a ocorrência de cancros;
(3) Eliminar doenças por abuso de álcool e sal;
(4) Estimular a resistência imunitária;
(5) Melhorar a situação sanitária em geral, a qualidade e as manifestações da vida e alongar a sua duração.

4. Equilíbrio entre grupos de alimentos nas proporções sugeridas por A Roda dos Alimentos portuguesa e atender à grande necessidade de água e aos perigos do sal. A finalidade é:
(1) Satisfazer as necessidades de calorias com alimentos naturais de modo a que fiquem também satisfeitas as necessidades de nutrimentos reguladores;
(2) Despertar a sensação de saciedade quando estão satisfeitas as necessidades de todos os nutrimentos.

5. Utilização de alimentos de boa qualidade higiénica, ou seja, sem microorgasnismos infectantes e suas toxinas, nutricionamente adequados ou seja, com uma composição nutricional conforme às exigências do corpo, e desprovidos de inquinantes e de aditivos perigosos, suspeitos ou supérfluos. Respeito por preceitos, preferências, poder de compra e intolerâncias de cada um. A finalidade é:
(1) Prevenir infecções, infestações e intoxicações;
(2) Evitar substâncias não nutritivas e antinutritivas, alergizantes ou com actividade farmacológica;
(3) Evitar a troca de produtos naturais por substitutos industrializados com efeito antinutritivo ou com valor nutricional nulo, reduzido ou não balançado;
(4) Impedir carências ou sobrecargas de nutrimentos;
(5) Evitar recusas a certos alimentos e despertar interesse por comida.

6. Adopção de preparações culinárias simples e gastronómicas que combinem alimentos e temperos de forma agradável e fácil de digerir, sem destruição de nutrimentos, com pouco ou nenhum sal e sem adulterar as gorduras usadas para cozinhar. Formulação de ementas bem equilibradas, agradáveis e respeitadoras de hábitos e tradições, embora abertas à inovação. A finalidade é:
(1) Predigerir, esterilizar e beneficiar sabores e odores;
(2) Dar prazer;
(3) Evitar que se tenha apetite quando se está saciado;
(4) Evitar a formação culinária de irritantes digestivos, tóxicos e
carcinogéneos.
O que acabámos de expor salienta as condições biológicas da alimentação saudável; é importante respeitá-las mas não é suficiente. De facto, o acto de comer, através do qual nos alimentamos (e, consequentemente, nos nutrimos) é muito mais do que alimentação: traduz modos de estar na vida e é uma manifestação cultural.
Independentemente das diferenças educacionais e culturais, a nossa espécie afinou, pelo menos desde a revolução neolítica, o acto de comer em expressão de convivência, ou seja, em oportunidade de comunhão familiar, de grupo ou colectiva: muitas vezes prosaica e remediada, menos vezes festiva e comemorativa.
Romper com a comensalidade convivencional gera mal-estar emocional, perturba a escolha e a combinação de alimentos e perturba o mecanismo da saciedade. Uma das razões do mau comer das sociedades modernas deve ter relação com o vulgar comer isolado dos dias de hoje e com o retomo ao posicionamento do homem paleolítico: recolher e caçar menos criteriosamente e mais ao acaso, que é o procedimento do homo urbanus insapiens ao percorrer um hipermercado.



Deixe o seu comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Fica a saber como são processados os dados dos comentários.